quinta-feira, janeiro 23, 2025

Minha Querida Helena (45)

Minha Querida Helena,

Ensaio estas primeiras letras acabado de chegar de tua casa. Encontrei-te doente e tristonha, como seria razoável de esperar de alguém que se encontre com a saúde abalada. Em abono da verdade, devo dizer que já te encontrei em pior estado, mesmo menos doente.

Da parte da tarde e da noite que passei em tua casa, retenho um sentimento ambíguo, de um encontro sem sal nem pimenta, talvez por isso calmo. Custa-me, no entanto, admitir que vi numa tarde mais televisão que a que vejo habitualmente em vários meses. Nota que não considero neste cômputo o futebol, que não é televisão no sentido próprio do termo. Sentado no sofá, frente à televisão, senti alguma tranquilidade mas, também, desconforto: o desconforto de um uso desqualificado do tempo; o incómodo de uma espécie de esposo que para ali está à espera que lhe sirvam o jantar. Tu sabes quão desconcertado eu fico nesses papéis. Como quer que seja, foi tudo mais ou menos, se pusermos de lado o teu mal-estar físico.

Este dia poderá ter sido o pronuncio de uma semana que antecipo ou desejo pouco agitada, porque as semanas agitadas, se nos trazem vida, trazem-nos, de idêntico modo, desgaste. E desgaste já tenho quanto baste. Não é que eu, a poder escolher, escolhesse a tarde sensaborona que tive mas, tratando-se da semana, talvez seja mesmo a que me convém nesta altura. A ver vamos se me sobra espaço e concentração para dar seguimento ao trabalho que venho adiando, há semanas.

O trabalho, como tu sabes, é uma componente essencial do meu equilíbrio. Algumas vezes, é mesmo todo o suporte do meu equilíbrio psicossomático, o que, contraditoriamente, não deixa de ser uma circunstância infeliz. Nesta ocasião, queria no entanto retornar ao trabalho sereno e, serenamente, construir o texto e a reflexão teórica que o texto esboçado precisa. A ver vamos se lá vou chegar. Pelo menos, o dia que agora tem termo afigurou-se sereno, se bem que sensaborão.

Pena que a minha Helena se encontre adoentada e tristonha. Amanhã hás de sentir-te melhor!


José Cadima

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