Minha Querida Helena,
Depois do teu inesperado telefonema, depois da tua afirmação critica “...mas não tocaste à campainha !” - como se tu tivesses tocado à minha ou, mais simplesmente, me tivesses feito chegar uma linha ou um aceno – vencendo resistências internas, fui visitar-te. Até ao momento em que respondeste à porta, não dei por seguro que a deslocação valesse a pena. Consegui ver-te, falar-te, e daí que tenha dado por útil o meu esforço.
Pela manhã tinha lido as três cartas acabadas de receber, de onde não tirei muito mais que a tua insistência nalgumas obsessões, e mesmo leituras de factos que só tu podias fazer (indo buscar razões descortináveis apenas por ti e elaborando sobre dados da tua cabeça). O que achei nelas de novo eram as preocupações que exprimias com o momento psicológico do João Miguel. Daí, e de pouco mais, se podia deduzir que tinhas lido as minhas cartas. Aliás, outro tanto retirei da conversa que mantivemos depois: dados cruciais em matéria de evolução do meu equilíbrio emocional e de opção de vida que te fui transmitindo passaram-te ao lado, conforme te sublinhei, incrédulo. Admiras-te tu depois que eu receie as interpretações que dás ao que oralmente te digo. Contesta tu que eu recuse ser questionado por actos e compromissos que tu tomaste de uma maneira e eu de outra.
E depois, minha querida, onde pretendes tu chegar ou aonde queres que te levem a tua teimosia em descuidares o arranjo dos teus cabelos e o desarranjo da tua casa? Que afirmação de vontade é essa? Para mim, Helena querida, isso não passa de uma forma de chamares à atenção ou um sinal de protesto que queres dar. O pior é que, com esses sinais e essas atitudes, hostilizas aqueles que queres cativar e te hostilizas a ti, porque essa também é peça do teu bem-estar físico e psíquico. É o princípio de um circulo vicioso que só tu podes quebrar, e que, não obstante, magoa todos.
Pois claro que estás doente e isso justifica muita coisa. O problema é que essa é razão fraca quando estão em causa uma pintura e um corte de cabelo. Como te disse, a importância desse particular facto não está nele mas no simbolismo que ele acarreta. Atrás deste facto vêm outros e outros mais e, finalmente, temos uma mulher desmotivada, doente, cansada, confusa, mais doente, mais fragilizada, agonizante. É uma forma de chamar a atenção, de protestar injustiças e desatenções mas é a que magoa mais e, em primeiro lugar, ao “grevista”.
É nesse sentido que não há lugar para outra coisa que não seja começar tudo de novo. O amor – mesmo protestado - não chega. O amor levou-nos onde? O amor, Tróia da minha desesperança, levou-te onde? A Tróia que vale a pena reconstruir há-de ser sólida, fresca, apetecível como a maça que condenou Adão.
José Cadima
Ps: por causa das dúvidas,
aqui deixo o meu endereço electrónico institucional; a saber: jcadimaribeiro0@gmail.com. Através dele
mantenho-me em contacto com o mundo 24 horas por dia, todos os dias da semana.
A sociedade pós-moderna também nos trouxe coisas que valem a pena.
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