quarta-feira, janeiro 31, 2007

Dor de amor

Tem que se ir com calma
pois apenas para o nada
eu me sinto preparado.
Para tudo o mais
eu sinto-me acabado.

Quando tudo acontece,
eu tenho que me preparar,
pois um abalo
me vai arrastar para o ódio
ou para o amor.
E a verdade é que mesmo o amor
me traz dor.

José Pedro Cadima

domingo, janeiro 28, 2007

Questiono coisas inquestionáveis

Todos os dias questionamos
coisas sem questionamento,
até que descobrimos
que não é bem assim.
Questionamos o ar.
É possível questionar o ar?
Não é ar!
São sprays e tabaco.
Questionamos a terra.
É possível questionar a terra?
Não é terra.
É lixo! É um aterro!
Questiono os sonhos.
É possível questioná-los?
Não são sonhos,
nem pesadelos.
São a realidade.

José Pedro Cadima

sexta-feira, janeiro 26, 2007

Minha Querida Helena

Nestes altos e baixos de ânimo, por razões próximas que não sou capaz de descortinar, retorno ao ponto mais baixo do ciclo. É o ânimo e é o cansaço, que em mim se apresentam associados. Se a semana decorresse mais intensa em matéria de solicitações de trabalho, não haveria espaço para estes sinais exteriores de debilidade, isto é, teriam que aguardar oportunidade. As coisas são entretanto como são e, por assim ser, volto ao estado de agonia na sua dimensão mais embaraçosa.

Não ligo esta ressaca aos telefonemas (dois) recentes que me fizeste, nem à visita que te fiz. Não digo que não me tenham afectado mas, se concorrem para este meu momento psicológico, fá-lo-ão em adição de razões mais profundas. Aliás, hoje não me telefonaste, embora eu mantivesse a expectativa que o fizesses. Porventura o questionário com que me brindaste ontem ficou então preenchido, pelo que não permanecia justificação para contacto posterior. Tens que conceder, no entanto, que a interrupção abrupta da ligação (por força do esgotamento das moedas) não permitiu que me desses conta do sucesso ou insucesso das respostas.

Neste interregno de comunicação, fui processando os dados que me havias feito chegar. Desses, talvez te surpreenda que o que me mereceu maior ponderação tenha sido o que se exprime na circunstância de me teres visto movimentar em Braga, sendo seguro que eu não te vi. Não mereceria atenção particular não fora a coincidência de tal se ter passado de modo idêntico em diversas outras ocasiões, a crer nas tuas alegações. E, confesso-te: gostaria de te ter visto desta e das outras vezes, particularmente desta vez.

Não te vi - disso não me resta dúvida – e não entendo como pudeste tu ver-me sem que eu te visse. A verdade é que, se a minha vista não é o que já foi, a tua não me parece em melhor estado. Tu mesma o dizes. Resulta então, daqui, um mistério. O mistério adensa-se quando eu sou visto por “A” ou por “B”, acompanhado, neste e naquele sítio, mesmo que não o tenha frequentado em período recente ou lá tenha estado sozinho. Tens que admitir que estes são dados fortes o bastante para me prenderem a atenção. Tanto mais quanto me sabes um cultor da ficção científica e um adepto confesso dos efeitos especiais. Aliás, como costumo afirmar, para ensaio sobre as misérias do quotidiano basta o próprio quotidiano. Disso fazem espectáculo diário os media.


Eis, Helena querida, um retrato do meu estar psicológico. Será bastante fidedigno já que o que está escrito antes foi-o ao sabor do pensamento livre (outros diriam, ao sabor da pena), não antecipando este final de divã de psiquiatra. É bom que assim seja para que o retrato surja bem autêntico, sem maquilhagem e sem acerto de cabelo. Perante ti posso expor-me despido, segundo creio.

Não tenho conselhos para dar ao psiquiatra. Também não lhos peço. De ti também não os pretendo receber. Se fossem beijos...


Braga, 9 de Setembro de 2004



José Cadima


Ps: correndo o risco de ser acusado de uma súbita simpatia pelo Ps. (com um pontinho em vez de dois pontos – o “s” pequeno é para simbolizar o estado em que está o socialismo), que declaro não ter qualquer fundamento, sou obrigado a recorrer outra vez a esta figura para reparar os efeitos de uma gralha que pousou sobre a data da carta de ontem, fazendo aparecer um seis onde, em verdade, estava um oito. Embora a culpa seja toda da gralha, por uma questão de afinidade com aquela, venho assumir a responsabilidade do erro.

quarta-feira, janeiro 24, 2007

Afrodite

Então Afrodite,
onde estás tu
quando te invoco?
Onde estás tu
quando, sem amor,
eu sufoco?
Onde estás tu,
quando, rejeitado,
quase enlouqueço?

Afrodite!!!
Onde estás tu
quando da sorte
eu me separo?
Onde estás tu
quando com a rejeição
eu me deparo?

Afrodite! Afrodite!
Onde estás tu
quando, sem amor,
eu desespero?
Onde estás tu
quando da rejeição
eu não recupero?
Onde estás tu
quando uma amada
eu quero?

José Pedro Cadima

terça-feira, janeiro 23, 2007

Já só acredito na inspiração

Sou um homem sem fé
nem religião.
Já só acredito no que se vê;
em mais que isso não.
Os santos
são figuras no altar
e Jesus
é um senhor
pregado na cruz.
Olhei toda a sociedade
e nela já não acredito.
Pelas coisas que tivemos,
pelas escolhas que fizemos,
pelos chefes que escolhemos
já só acredito
naquilo que escrevo.

José Pedro Cadima

domingo, janeiro 21, 2007

Choram os céus

Choram os céus.
Choram as pedras,
as casas e os animais.
Choram as árvores.
Choram as estrelas,
as flores e as pessoas.
Choro eu.
Choras tu.
Todos, choramos lagoas.

José Pedro Cadima

sábado, janeiro 20, 2007

Porque escrevo?

Porque escrevo eu?
Não sei o que escrevo,
mas sei porque escrevo.
Tudo tem um sentido,
um objectivo.
Escrevo para tentar
apagar uma ilusão;
escrevo para desabafar uma emoção.

José Pedro Cadima

sexta-feira, janeiro 19, 2007

O amor

O amor
não tem sítio certo.
Pode ser numa escada,
num banco,
num passeio.

O amor
não se define.
Pode ser um beijo,
uma palavra,
um abraço.

O amor
não tem tempo.
Pode ser num dia,
numa noite
ou - quem me dera – sempre!

José Pedro Cadima

terça-feira, janeiro 16, 2007

Venha o demónio das mil lágrimas!

Venha a mim o demónio
das mil lágrimas
e me faça chorar tanto
que até oceanos encha,
me faça chorar tanto
que até a Terra inunde.

Venha a mim o demónio
das mil lágrimas
e me faça chorar tanto
que a água suba
até ao pico da montanha mais alta
e uma onda leve
o último sobrevivente,
e todos te culpem
por me fazeres chorar.

José Pedro Cadima

segunda-feira, janeiro 15, 2007

Que sou eu?

Que sou eu
senão um eterno apaixonado,
um bêbado de amor,
um embriagado de angústia e de esperança.
Eu sou o poeta
que beijou uma bêbada
ou foi ela que me beijou a mim
(pois ela negou o meu beijo)?
Aqui, eu sou o romântico,
o antigo romântico,
o novo gótico
ou talvez seja, apenas,
o pós-caótico.

José Pedro Cadima

domingo, janeiro 14, 2007

Aqueles momentos

Há aqueles momentos,
sem nada que escrever,
sem nada para dizer.
Pois bem, este não é um deles,
e, mais do que nunca,
apetece-me escrever,
correr, saltar, delirar
e, sobretudo, estar
a teu lado e abraçar-te.
Apetece-me inspirar
e expirar muito lentamente,
ouvir a tua respiração
em sincronia com a minha.
E apetece-me
chegar os meus lábios
ao teu ouvido, lentamente,
e dizer-te que te amo.

José Pedro Cadima

sexta-feira, janeiro 12, 2007

Minha Querida Helena

A agitação da última dezena de dias retirou-me o tempo, a concentração e a sensibilidade necessários para te escrever e para que o que te quisesse transmitir fizesse sentido. Estive nesse investimento de corpo inteiro e se, por um lado, me senti vivo, por outro lado, esgotei-me num projecto em que sempre achei deverem estar outros. A intriga, a cumplicidade de medíocres, a falta de coragem e a incompetência convergiram para me tirar de cena, o que, se me traz alívio, traz-me, no mesmo passo, uma raiva enorme. Sempre me custou ver triunfar os medíocres e os incompetentes!
Depois de, durante uns poucos dias, ter-me sentido vivo, receio agora retornar à minha agonia. Até porque viver custa e as energias que nesse esforço são gastas dificilmente são repostas. A ver vamos.
Ao jeito de compensação, tive a alegria de te ver jovem outra vez, nesse teu arranjo de cabelo que demorou tanto que me pareceu uma eternidade. Ainda bem que abandonaste a tua obsessão de te apresentar infeliz para fazer bem presente aos outros - especialmente a mim - a tua insatisfação. Minha querida: a infelicidade não precisa de ser cultivada; nasce espontaneamente de qualquer solo. O que necessita de ser cuidado é o gosto de viver. Jovem outra vez, minha querida!
Esse corpo e alma rejuvenescidos não são, entretanto, é bom que tenhas isso presente, fato que se use e se pendure no guarda-roupa a aguardar a estação homóloga seguinte. São fato de todo o ano. Só assim me reconheço na minha Helena. Só assim reconheço o meu amor.
Pese embora o episódico retorno à vida de que te falo a abrir esta mensagem. Não tenho a capacidade de me renovar que tu possuis. Gostava da ter, digo-te. Gostava da ter por quanto a mereces. Não sendo assim, fico a desejar colher de ti a força que sinto que me escapa.

Braga, 2 de Outubro de 2004


José Cadima

quinta-feira, janeiro 11, 2007

Coração de Cristal

Coração de cristal...
Eu tenho um coração de cristal,
tão frágil, tão leve...

Eu tenho um coração de cristal
estalado a meio...
Eu tenho … um coração de cristal...
E tenho-o partido... a meio...

José Pedro Cadima

terça-feira, janeiro 09, 2007

Mundo de ouro

Mais um arrepio na espinha
de uma lembrança passada,
de algo que eu quis,
de algo que não tive...

Cruel mundo de ouro,
onde tudo é possível ver,
mas onde tudo é guardado
para aqueles que não precisam...

José Pedro Cadima

segunda-feira, janeiro 08, 2007

Olhos de quem chora

Vês estes olhos?
São olhos de alguém que te ama;
são olhos de alguém que chora.

Sabes...
Sabes quanto anseio
ver o meu amor correspondido.
Sabes? Não te importa.
É por isso que estes são olhos de quem chora!

José Pedro Cadima

sábado, janeiro 06, 2007

Chora comigo

Chora! Chora comigo!
Sente algo; sente algo por mim,
como eu sinto por ti.

Quando estou contigo...
Sim, quando eu estou contigo…

Chora! Chora comigo
ou vai-te embora,
para sempre!

José Pedro Cadima

sexta-feira, janeiro 05, 2007

Festim de rosas

Num festim de rosas,
podes encontrar coisas espantosas,
desde um amor estonteante
a um livro apaixonante
ou, até, uma dor profunda e obscura,
que te aperte tanto o coração que se assemelhe a tortura.

José Pedro Cadima

quinta-feira, janeiro 04, 2007

Minha Querida Helena

Não tendo cedido perante o cansaço, estou a morrer de saudades tuas. Faltam-me as tuas palavras de conforto, falha-me o sossego da tua presença, falta-me o descanso do teu corpo, falta-me a alegria do teu sorriso, falha-me a esperança do teu amor. Poderá alguém sobreviver em condições tão extremas de carência? Não creio.

Responder-me-ás: culpa tua! Contrapor-te-ei: culpa minha que nunca soube lidar com o amor e, querendo conciliar o que hoje sei inconciliável (valores básicos de respeito pessoal, de dignidade humana, de tolerância ante expectativas de um projecto de vida mais feliz), perdi o direito a ser amado. Aprendi-o de experiência própria. Aprendi-o tardiamente por me recusar a acreditar que um sentimento como o amor não inspirava tolerância e respeito pela nobreza desse sentimento.

Aprendi-o em vésperas de me esgotar de saudades: saudades de uma pequerrucha plena de energia e a transbordar carinhos; saudades de uma poetisa que cantava o rio, os pássaros, as flores e a paixão que a embalava. Percebi-o quando o meu amor deixou que se instalasse no seu olhar uma sombra cinzenta, a poesia deu lugar a um discurso arrastado, de desapontamento, e nem o rio, nem as flores, nem o chilrear dos pássaros foram capazes de voltar a levar-lhe inspiração e sonho. Nessa altura, perdi-te. Desde essa altura, fiquei também eu condenado a esvair-me, senão em desencanto e desesperança, em saudades.

Chegados a este termo, imagino-me a recomeçar tudo de novo, desde o primeiro olhar, o primeiro beijo, e culpo-me por não ter sabido guiar-te por trilhos mais seguros e mais portadores de futuro; culpo-me por não ter sabido preservar-te a energia que usavas transportar e os carinhos de que transbordavas. Pensando em tudo isso, e muitas coisas mais, enquanto me culpo de não ter sabido preservar o teu sorriso, vou morrendo de saudades tuas.

Braga, 22 de Agosto de 2004


José Cadima

quarta-feira, janeiro 03, 2007

Felicidade...

As minhas mãos ardem-me
só da vontade de escrever
e desabafar tudo aquilo
que sinto e vejo.
...
O silêncio, o choro,
o amor, o ódio...
...
Quem sabe se um dia
serei capaz de ser feliz...
Tudo o que sinto
parece trazer-me infelicidade!
E tudo o que procuro, não encontro!
Choro. Que mais posso fazer?
Que mais farias tu no meu lugar?
Pois é, nada senão chorar.

José Pedro Cadima

segunda-feira, janeiro 01, 2007

O que tu me transmites

Tu transmites-me
um estranho sentimento
que me acalma,
algo que me faz
sentir mais humano
e menos cadáver.
O que tu me transmites
é algo especial,
que me faz viver.

José Pedro Cadima