Minha Querida Helena,
Olá! Espero que estejas bem.
Espero, inclusive, que tenhas tido ocasião para ires ao cabeleireiro e te
cuidares, de um modo geral, agora que não me tens a tomar o teu tempo. Nota
que, se comigo não precisavas ter essas atenções, doravante é diferente.
Escolhi esta manhã de Domingo
para este instante de intimidade contigo. Imagino-te em casa, atarefada nas
tuas arrumações e desarrumações mas, porventura, estarei bem errado. Talvez
seja esta chuva que se faz sentir em Braga que me traz a melancolia que
pressentirás nas minhas palavras escritas. Daí, talvez, digo, a fuga para a
intimidade a que aludo antes. Como seria se estivesse calor, não te sei dizer.
Sabes: tenho usado parte do
meu tempo para dar substância ao projecto de produção do livro do meu filho
mais velho, de que te falei. Definitivamente, resolvi assumir o trabalho de
editor dos seus textos. Aguardava que me pudesses ajudar mas, circunstâncias
que tu bem conheces, inviabilizaram contribuição que eu tinha por preciosa.
Assim são as coisas, e momentos há em que não nos resta senão admitir a nossa
impotência.
É um trabalho que ora se me
sugere gratificante ora me é penoso. A penosidade não releva do esforço, em si,
mas dos conteúdos com que vou deparando, demasiado sofridos, denunciando uma
violência de sentimentos que me surpreende. Sobretudo, na dimensão desesperança
da mensagem. Repara: são só catorze anos; catorze anos de uma vida a que eu fui
sempre dando o amparo que fui capaz .Podia ter sido mais, consinto, mas eu, que
o não tive maior, não me recordo de ter escrito mensagens de tamanha mágoa e
desapontamento, nessa idade. Os tempos são outros, sem dúvida, e talvez daí
venha a diferença entre duas personalidades intimas que eu pressinto tão
próximas. É bem certo que, nessa idade, eu não tinha ainda uma namorada, no
sentido comum do termo, pese embora as Helenas que se foram cruzando na minha
vida. Teria sido mais feliz se a tivesse, especulo eu, agora. Mas as Helenas,
tu bem o sabes, sempre me foram esquivas. E quanto eu as amei! Nem tu nem
ninguém é capaz de avaliar.
As Helenas, meu amor não
retribuído, têm sido a minha razão de vida e a fonte dos meus maiores
desencantos. É o meu fado!
José Cadima
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