sexta-feira, outubro 12, 2007

Criar ímpeto - 2ª parte

Neste momento, são dez horas e o Eduardo faz ecoar os seus passos no corredor. Sei que vai haver reunião na minha hora de almoço e ninguém me disse nada mais uma vez. Ouvi na casa de banho, enquanto estava na retrete. - Gabriel, sempre a ouvir a mesma porcaria! Vou fazer queixa se não baixares esse barulho! – Diz-me o Eduardo e continuou a andar.
- Eduardo…- Chamo por ele. Ele olha para trás. Na minha mão está uma pistola, a Beretta 92FS.
- Que estás a fazer Gabriel?
- Barulho!
Disparo. Nunca nada me tinha feito sentir tão bem. Era a terceira vez que tomava a iniciativa de reagir nesta empresa. Tinha prometido a mim mesmo que seria a última e, de uma forma ou de outra, tinha de resultar.
- Que se passou aqui?! Ouvi tiros!!
- Olá Roberto…
- Ga…briel?! - Gagueja Roberto exteriorizando o medo que o assaltou.
- Toma um curto.
Disparo sobre Roberto. A sensação de alívio sobe-me à cabeça. Corro até à sala de convívio e mato três tipos que estão lá sempre; nem o nome deles sei, mas sei que não fazem nada e recebem mais do que eu.
Vou em direcção ao Ricardo. Está debaixo de uma cadeira com as calças molhadas.
- Por favor Gabriel, não me mates…
- É o meu novo programa de gestão. Tenho de ser rápido a pô-lo em prática antes que me roube a ideia.
Sexta bala num sexto idiota. A um metro de distância, não falho.
Vou pelas escadas até ao piso de cima. A Leonor está no gabinete do director dos Recursos Financeiros. Estão os dois num namorisco.
- Não acredito que recebem mais por fazer isto…
- Gabriel?! – Gritam os dois em simultâneo.
- Eu também namoriscava a Leonor e não recebia mais por isso…
- Seu… - A sua frase foi interrompida pelo aparecimento da minha arma.
- Se fosse preciso eu namoriscava o Sr. director só para receber o que recebe a Leonor.
Foram duas balas pelos dois cornos.
Matei primeiro o director para poder ver Leonor chorar, não pelo director, pelo medo da morte.
O André Martins mandava o elevador subir desesperadamente. Nem olhava para trás: o medo era demasiado. Deve ter ficado ainda com mais medo quando sentiu o metal frio na nuca.
- Estive agora com o director dos Recursos Financeiros e ele disse-me que tem de haver uma redução no pessoal.
Mijou-se de medo. A arma justificou o medo. Sinto-me bem, sinto-me aliviado. Penso agora que estou a ser incompetente pois a escolha da arma talvez safe o meu bem amado director dos Recursos Humanos e uma bomba tinha-me poupado todo este trabalho.
O elevador ia a descer e abriu-se no meu piso. Era o meu querido, amado, sacrificado director! Quem poderia imaginar que o André iria ajudar-me no meu melhor projecto!
- Olá Sr. director! – Sei que os meus olhos reluziram de tanta alegria.
- Que vem a ser isto?
- O cheiro no elevador é do senhor. Não me culpe disso também a mim!
A cara do Sr. director adquiriu uma expressão pouco feliz e a arma largou as restantes balas no seu corpo.
Entrei no elevador e fui até ao rés-do-chão. As portas abriram e o Jorge ficou a olhar para mim com ar misto de medo e de estupefacção.
- Bom dia Jorge…
- Sr. Gabriel…
Apontei a arma à minha própria cabeça.
- Jorge… Não te preocupes. Vim cá abaixo dizer-te que foste promovido.
A polícia chegou ao local. Levaram o Jorge para interrogar. Os jornalistas cercaram o local. Aquilo era o novo holocausto. Aquilo era e vai ser durante muitas semanas o título dos jornais.
A empresa acabou, o Jorge ficou sem emprego. Felizmente, um jornalista pagou-lhe para que ele falasse do incidente e o Jorge ficou rico.
Ele foi até à minha campa e agradeceu a promoção.

José Pedro Cadima

Sem comentários: