sábado, outubro 18, 2008

O verdadeiro prazer - II

Dia 2: “É tudo uma questão de timing; uma questão de saber dizer as coisas certas nas alturas certas; uma questão de tudo o resto não existir ou, se existir, apresentarmo-nos de igual para igual ou até superiores. Isso impressiona; chama-se segurança. Toda a gente ambiciona sentir isso e, quando alguém tem confiança, desperta interesse! Parece que o que dizes é realmente verdade, é realmente importante, é realmente interessante, mas, se virmos bem, tudo o que digas ou possas dizer é sempre descartável. Os seres humanos funcionam assim.”
Os ensinamentos que me são transmitidos são assustadoramente assertivos. Se calhar é isso que me faz ter interesse neles… Se calhar é essa a ideia que devia ter de tudo. Ontem… Como é que ontem?! Oh… Será que é esta voz que me fez ganhar coragem? Será mesmo o meu subconsciente? “Não importa…” Pois não…Nada importa!
Ontem mandei uma mensagem à Rita a convidá-la para sair e ela disse que sim. Vamos dar um passeio pela cidade, ver os jardins e assim…
Combinámos encontrarmo-nos junto à escola. Ela está atrasada cinco minutos, mas já a vejo ao fundo. Vem com seus cabelos castanhos decoradas com madeixas naturais loiras. Os seus cabelos são levados com o vento. A primeira vez que a vi foi ao vento. A primeira vez que reparei nela, era o vento que a puxava, levando-a pelos seus cabelos…
- Olá! – disse a sorrir
- Olá! – respondeu ela com um sorriso copiado do meu
Começámos a andar. Entrámos num jardim e nenhum de nós falava. “Coragem”. Disse a voz, e eu ganhei coragem e as palavras saíram:
- Estás melhor que ontem? Já tens tudo na cabeça?
- Já! – sorriu-me
“A mentira é tão bonita. Não te preocupes com esse assunto. Comenta algo, critica, mostra-te de pensamentos próprios, deixa-a a pensar. A confusão é meio caminho…”
- Gosto de ver aqueles idiotas ali, com 2 pares de óculos de sol - ela riu-se, concordou e continuou a conversa.
Entretanto, a voz ia-me dizendo, constantemente: “espera”. Ela, por sua vez, ia falando.
Como gostam estas raparigas de falar, como gostam que concordem com elas. É tudo isso o que importa, o timing.
“Sempre aprendeste alguma coisa. Rápido! Faz um comentário sobre aquele cão. Não sejas cómico desta vez”. E não fui. Crucifiquei o cão, pela nojice como se apresentava. Rita concordou com cada letra do que disse, até com os “á” sem “h”, isto é, mal escritos e mal ditos.
A tarde foi boa. Cheguei a abraçá-la uma ou outra vez. Assumi uma postura familiar, de amigo íntimo. Tentei ganhar-lhe a confiança. Tive coragem para lhe falar. Tive segurança ao falar. Mantive-me calado de quando em quando. É giro impressionar alguém. É tão giro impressionar alguém. Talvez seja isso que nos faz vazios: ter que respeitar certas coisas para poder ter outras. É uma espécie de custo de oportunidade!
Ela estava a adorar. Á medida que a tarde corria isso sugeria-se mais óbvio: nos comentários que fazia, na familiaridade com que me tratava. Pela minha parte, tudo isso me fez sentir miserável. Como vou agora acreditar em mim? Não… na voz, porque quando estamos desesperados é noutros que nos apoiamos e noutros que acreditamos, e quando os outros estão certos, fingimos ser como eles.
- Então, até amanhã Alexandre!
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José Pedro Cadima

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