domingo, fevereiro 17, 2008

“As meias e as pernas - II”

“Por incómodo que seja dirigir-me aos meus leitores de uma gare de um aeroporto, reconheço-lhe também vantagens, a menor das quais não será o exotismo da paisagem humana que vai circulando nos corredores. Admito, no entanto, que, desse ponto de vista, uma rua de Londres ou as celebradas escadas da Praça de Espanha, em Roma, podem ser mais exaltantes.
Perdoar-me-ão os meus leitores que dessa paisagem humana retenha sobretudo a componente feminina, mas há coisas que são mais poderosas que nós, quer dizer, que a componente consciente assumida das nossas vidas. Para além disso, que graça podem ter as meias (as meias e as pernas) de um escocês em trânsito? Olhando quem passa, acontece-me amiúde recordar outras mulheres, nomeadamente a(s) da minha própria vida, como se usa dizer; lembrar e sentir saudades. Talvez por isso não goste de partir sozinho; se bem que algumas vezes saia alimentado pela vontade de voltar a ganhar o espaço que me falta, e o desejo e entusiasmo que esmoreceram. Alguém terá escrito que são insondáveis os desígnios do homem. Nestes particulares momentos, só posso expressar o meu total acordo, se bem que noutras ocasiões me pareçam bastante mais sondáveis: concretamente, quando há mulheres interessantes por perto.”


J. C.

(reprodução parcial de texto do autor identificado, publicado no jornal Notícias do Minho, em 96/10/18, em coluna regular intitulada “Crónicas de Maldizer”)

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