domingo, outubro 29, 2006

Minha Querida Helena

Olá! Espero que estejas bem. Espero, inclusive, que tenhas tido ocasião para ires ao cabeleireiro e te cuidares, de um modo geral, agora que não me tens a tomar o teu tempo. Nota que, se comigo não precisavas ter essas atenções, doravante é diferente.
Escolhi esta manhã de Domingo para este instante de intimidade contigo. Imagino-te em casa, atarefada nas tuas arrumações e desarrumações mas, porventura, estarei bem errado. Talvez seja esta chuva que se faz sentir em Braga que me traz a melancolia que pressentirás nas minhas palavras escritas. Daí, talvez, digo, a fuga para a intimidade a que aludo antes. Como seria se estivesse calor, não te sei dizer.
Sabes: tenho usado parte do meu tempo para dar substância ao projecto de produção do livro do meu filho mais velho, de que te falei. Definitivamente, resolvi assumir o trabalho de editor dos seus textos. Aguardava que me pudesses ajudar mas, circunstâncias que tu bem conheces, inviabilizaram contribuição que eu tinha por preciosa. Assim são as coisas, e momentos há em que não nos resta senão admitir a nossa impotência.
É um trabalho que ora se me sugere gratificante ora me é penoso. A penosidade não releva do esforço, em si, mas dos conteúdos com que vou deparando, demasiado sofridos, denunciando uma violência de sentimentos que me surpreende. Sobretudo, na dimensão desesperança da mensagem. Repara: são só catorze anos; catorze anos de uma vida a que eu fui sempre dando o amparo que fui capaz. Podia ter sido mais, consinto, mas eu, que o não tive maior, não me recordo de ter escrito mensagens de tamanha mágoa e desapontamento, nessa idade. Os tempos são outros, sem dúvida, e talvez daí venha a diferença entre duas personalidades íntimas que eu pressinto tão próximas. É bem certo que, nessa idade, eu não tinha ainda uma namorada, no sentido comum do termo, pese embora as Helenas que se foram cruzando na minha vida. Teria sido mais feliz se a tivesse, especulo eu, agora. Mas as Helenas, tu bem o sabes, sempre me foram esquivas. E quanto eu as amei! Nem tu nem ninguém são capazes de avaliar.
As Helenas, meu amor não retribuído, têm sido a minha razão de vida e a fonte dos meus maiores desencantos. É o meu fado!

Braga, 8 de Agosto de 2004


José Cadima

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