segunda-feira, março 01, 2010

As leituras do cronista

1. A falta de tempo raramente me permite estar atento ao que se vai dizendo e escrevendo por aí. Mesmo quando episodicamente arranjo tempo para escrever uma das minhas crónicas, não raro pouco acompanhamento dou aos comentários que acabam por chegar. Dada a natureza das matérias que trato, também não seria expectável ter grandes reacções. Verdade seja dita que, ao contrário doutros que escrevem para ser falados, a mim pouca diferença me faz que comentem os meus textos, quero dizer, o que escrevo é sobretudo para mim, memória que gosto de fazer de emoções, factos e bizarrias do tempo que vivemos. Dessa forma, fico liberto da obrigação futura da escrita de livro de memórias.
2. Por simples acaso e oportunidade de circunstância, nestes derradeiros dias, acabei a dar alguma atenção a um ou outro texto que os meus bons amigos editores deste blogue se vão dando ao trabalho de produzir e, sobretudo, aos comentários que, em crescendo, lhe aparecem anexados. Isso fez-me descobrir quanta gente interessante e preocupada com o bem-estar do seu semelhante (ou diferente, quiçá) por aí anda e, também, gente (pressupostas mulheres) “raivosa” doutra gente, alguma mais raivosa que outra, está bom de ver. Ficou-me uma certa raiva, por assim dizer, de não ser o alvo da cobiça (pressuposta cobiça, se bem entendi).
3. Deixo claro que em tempos já longínquos, dava eu os primeiros passos como cronista, também fui alvo de algumas atenções femininas e até, confesso, de alguns olhares mais furtivos. Mas esse era tempo com outro recato. Só alguma leitora mais atrevidota me fazia chegar uma nota escrita (um bilhetinho) denunciando a atracção que eu, ou melhor, a minha escrita, lhe provocavam. A nenhuma lhe ocorreu vir para esta praça pública mostrar inveja dos sucessos amorosos do cronista ou daquelas que lhe roubavam o coração. Também é verdade que, nessa altura, a Internet navegava ainda por outras paragens, mas nem por isso deixa de ser uma menos retinta verdade o que digo.
4. Feito consultório sentimental ou divã de psiquiatra, acaba este blogue por adquirir uma dimensão que os seus editores, os meus bons amigos José Cadima e José Cadima, não tinham antecipado. Não é que a lógica de serviço público não estivesse no seu espírito. Foi, aliás, a este título que fui convidado para trazer o meu contributo. Mas consultório sentimental… Fico contente por assim ter acabado por resultar. Desse modo, satisfaz-se quem tem conselhos para dar e generosidade bastante para o fazer gratuitamente, e quem está carente de um conselho amigo (umas vezes mais amigo que outras) ou está necessitado de se acolher num divã de psiquiatra. Talvez se perca alguma da dimensão cultural inicialmente visada mas, como bem diz o povo, o óptimo é muitas vezes inimigo do bom.
5. Como dizia, gostei de ler os comentários. Sendo verdade que, por essa via, a ideia de ser eu a abrilhantar o blogue com as minhas crónicas de análise social cai em grande medida por terra, não deixa também de ser verdade que as sedes de interesse que assim se introduzem se amplificam imenso, com consequentes ganhos em matéria de número e variedade de leitores. Digo isto a pensar no sucesso do projecto dos meus bons amigos editores do blogue. Pessoalmente, já que escrevo sobretudo para mim, esse resultado acaba por se me sugerir embaraçoso. Todavia, atento ao compromisso que assumi, homem de palavra que sou, vou continuar por cá por algum tempo mais, fazendo figas, em todo o caso, para que os meus escritos passem tão discretos como sempre. Posto que preservarei o carácter episódico do registo, espero bem que assim resulte.

J. C.

1 comentário:

Anónimo disse...

Caro J.C.

Com mulheres raivosas ou não por perto, deve continuar a escrever, porque escreve muito bem.
São muitos séculos a que as mulheres se habituaram a disputar homens. Já lhes está nos genes.
Embora desconfie que também tenha homens raivosos a fazer comentários aos seus textos. Estes sim, serão verdadeiros raivosos...
Talvez com a idade tenha ficado "mais interessante", J.C.. Já pensou nisso?
Deixe lá, enquanto as(os) raivosas(os) estiverem "anónimas(os)" não haverá problema de confronto real.