sexta-feira, janeiro 30, 2009

“Quando eu for grande”

“O meu sonho, quando for grande, é ser analista político. Não é o máximo? Vou também ter o meu clube de «fans» e receber imensas cartas e postais ilustrados. Só não decidi ainda se vou morar na Quinta da Marinha ou em Cascais. A seu tempo se verá.
É um trabalho bem árduo o de «fazedor de opinião» e que deixa muito pouco tempo livre para outros trabalhos menos nobres, mas o paizinho acha que é muito gratificante e, além disso, permite-nos dar notas aos políticos, ao Mário Soares, ao Guterres, ao Nogueira, ao Joãozinho, ao Fernandinho e à Sónia, e aos outros todos. Depois é que eles vão ver: não hei-de ser como o Marcelo que usa uma escala que começa em 15 e acaba em 18 (só para os amigos do peito).
Já comecei a treinar-me: o paizinho inscreveu-me no «karaté», onde a gente aprende a gritar forte, e, sempre que posso, vou com a mãe ao mercado do peixe e das hortaliças. A mãe não fica muito entusiasmada com a minha companhia por causa, como diz, da língua porca que lá se usa; mas eu já lhe fiz ver que quanto mais cedo eu começar a minha aprendizagem política mais hipóteses tenho de fazer figura na televisão. Só espero que na altura ainda se faça o «Flash Back», para eu poder substituir o Pacheco Pereira ou o Magalhães. Adoro aquela confusão, com todos a falarem ao mesmo tempo.
É gente muito sábia aquela, não acham? Não há nada que lhes escape: a retoma económica, as polícias, as escapadelas do Felisberto, a política de defesa baixa do Fernando, eu sei lá que mais. O que me deixa pouco à-vontade é aquela mania dos livros, do Marcelo. Porque raio é que o tipo acha que tem que meter livros na política?! Se os outros se lembram do imitar lá estou eu tramado também, e tenho que reduzir a dose diária de televisão. A não ser que eu constitua um escritório de fazedores de opinião política, e ponha os outros a lerem os livros. É uma ideia…
Há uma coisa que me preocupa no imediato: em que partido devo eu inscrever-me? Com a confusão que aí vai desde que o Cavaco se pôs ao fresco, a gente não sabe para quem é que há-de virar-se e, francamente, como é que se pode fazer análise política isenta quando não se sabe de que lado é que se deve estar?! Felizmente, sou ainda pequeno e posso esperar que a situação política se clarifique.”

J.C.
(reprodução integral de crónica do autor identificado publicada no jornal Notícias do Minho de 95/05/06, em coluna regular genericamente intitulada “Crónicas de Maldizer”)

1 comentário:

Anónimo disse...

Caro J.C.

Já há muito tempo que não me ria tanto com um texto dos seus.
Permita-me que lhe diga, mas a espécie a que se reporta tem vindo a proliferar, entretanto. E nem precisaram de deitar substral.
Mas estão mais tecnológicos e passaram a fazer o percurso de forma mais rápida, diria mesmo que alguns de forma super-sónica, embora o paizinho e a mãezinha continuem a dar uma ajudinha preciosa.
Admirei-me, ao fazer as contas e ao verificar que o Marcelo já anda há tanto tempo no negócio dos livros. O homem tem queda para o negócio!....