quarta-feira, dezembro 30, 2009

Balanço de um ano sem história

1. É sempre complicada a vida de um cronista, mas é-o mais em Portugal, um país em que não se passa nada: nem escutas a telefones do 1º ministro; nem fugas para a comunicação social de informação relativa a processos em segredo de justiça; nem comércio de favores na arrematação de obras públicas; nem ministros que esboçam corninhos com os dedos como resposta às “provocações” da oposição; nem casos “Freeport”; nem ministros da educação e do ensino superior que nunca se enganam e raramente têm dúvidas; nem desencontros entre o Presidente da Republica e o Governo; nem conselheiros de Estado muito sérios que acabam por demitir-se por incapacidade de sustentar a tese de que nunca tinham visto os cheques e os contratos que assinaram; nem banqueiros muito respeitáveis que fazem doações de dinheiros do banco que administram a filhos em dificuldades; nem … Em tais circunstâncias, resta ao cronista inventar os enredos que vai relatar ou fazer como as televisões e escavar em cada dia os motivos de reportagem que vão encher a hora das notícias, nem que se tenha que ir para a rua em dia de aguaceiros entrevistar o polícia do trânsito.
2. Sem histórias para relatar, como pode o cronista cumprir o ritual do balanço do ano? Diferente seria se o cronista vivesse em Itália, onde o 1º ministro, para além de televisões e de dinheiro, tem bom gosto. É verdade que houve quem não lhe gabasse o gosto, mas sabe-se como há gente invejosa em todo lado; homens e mulheres não são nisso muito diferentes, embora o sejam noutras coisas, sobretudo quando se apresentam ainda bem frescos(as). Não merecia o nosso país ter um 1º ministro assim? Claro que merecia … Um país com uma história tão grandiosa …
3. É triste, de facto, que o cronista se confronte com a realidade de um ano que não deixa que recordar. Obviamente, um cronista que se preze tem que recusar-se a admiti-lo e, à falta de objecto, resta-lhe objectar, nem que para tal tenha que presumir que, em Portugal, há árbitros que têm simpatias clubísticas que lhes vão saindo, raramente ao acaso, juntamente com o sopro do apito. Mais grave seria, todavia, que se reduzissem encargos com salários de funcionários públicos para contratar no sector privado serviços que importam em idêntico montante financeiro. Porém, sabe-se que isso não ocorre em Portugal, nem poderia alguma vez passar-se dada a pobridade de ministros e demais dignitários de Estado que, com alguma sorte, hão-de chegar a administradores de empresas públicas ou administradores de grupos privados que têm como principal cliente o Estado ou na respectiva administração gente de boas famílias, isto é, comprometida com Portugal.
4. Vergado pelo peso da evidência, na iminência de fracassar na nobre missão de elaborar o balanço de 2009, resta ao cronista equacionar se é hora de deitar a pena ao chão (neste caso, não é necessária a toalha porque a haver alguma coisa para limpar são suores frios, que usualmente correm com pouca abundância) ou se, num golpe de asa, consegue descortinar uma qualquer coligação negativa da oposição, apostada em fazer fracassar um governo que se pretende de homens bons, já que é difícil aplicar idêntico qualificativo às mulheres que circulam pelos gabinetes ministeriais. Tarde que seja para chegar a tempo com o balanço do ano, importa acreditar que a segunda opção seja materializável. Que o cronista sofre, isso não oferece dúvida!

J. C.

2 comentários:

Anónimo disse...

Caro J.C.

Afinal acaba por fazer um balanço de 2009 e é bastante perspicaz a fazê-lo!... Um 2009, igual a tantos outros, pois o ser humano se não mudou ao fim de tantos séculos, não vai ser agora que o vai fazer! Pelo contrário. Agora até está na moda ir a correr depois do Natal trocar as prendas que se vão recebendo... O Natal tornou-se um fiasco... mas para mim, este foi um dos melhores Natais e parece que não tive que trocar prendas. Aceitei-as, pois foram genuínas.
É verdade, era o que faltava deixar de escrever. Sem as suas crónicas o mundo torna-se mais cruel. Apareça...

RS disse...

Uma Excelente crónica.
Um óptimo 2010!