quinta-feira, novembro 02, 2006

Que nos resta?

Por vezes, mais do que as que gostaria, vejo tudo perdido. Visualizo, ainda que na minha cabeça, cenas de destruição, a destruição do que me é mais querido: a nossa relação.
Se nos zangarmos, se um de nós vir algo no outro que lhe seja tão perturbador que derrube toda a “nossa” magia, que nos restará?
Restar-nos-á aquela flor que um dia te ofereci, que nela levou alguma da minha devoção, uma prova de que a nossa magia seria eterna. Mas a verdade é que nada é eterno. A flor murchou e com ela murchou uma parte da minha devoção. Não é que me não me devote; é só que que fica a faltar uma razão.
Poderá, então, restar-nos aquele poema que um dia te escrevi, e que chorei e sorri ao escrevê-lo. Pela minha parte, talvez nunca nada tinha sido feito com tanta entrega, nunca nada teria sido feito para durar tanto tempo. O poema até inteiro está e aposto que repousa. Mas mais nada faz a não ser repousar. Será que te lembras dele, sequer? Será que ainda te diz alguma coisa? Que nos resta?

Nossos beijos são quentes. As línguas entrelaçam-se tal qual o sentimento que temos um pelo outro, chegando ao pontos até de se ser só um, o único e o mesmo. A gentileza dos nossos toques chega até a transmitir preocupação pelo bem-estar do nosso único ser. Se algo nos separasse; se a saliva secasse e nossas línguas não se pudessem unir; se algo nos provocasse o contrário da preocupação e todo o contacto fosse inexistente; que nos restaria?

Hoje algo correu mal e a magia não apareceu para nos salvar. Eu disse uma frase. Tu disseste duas. Eu tive que dizer mais uma para igualar-te, e de ti saíram tantas que lhe perdi a conta. Viraste-me as costas. Eu caí sobre os meus joelhos. Correste para longe; não vi para onde foste. Encostei a cabeça baixa aos meus joelhos e chorei. Sei que foste em busca de refúgio para chorares. Que nos resta?
Restam-nos os nossos corações, mas já partidos.

José Pedro Cadima (2006)

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