segunda-feira, agosto 20, 2007

Minha querida Helena

Escrevo-te esta mensagem esmagado. Estava-o antes, interpretando a rudeza das tuas palavras, e estou-o muito mais agora, após ler a mensagem sofrida, em forma de poema, que me dirigiste.
É bonito o poema. Transpira emoção e dor, a dor que se perceberia mesmo que a tua mão não se sugerisse trémula e as lágrimas não ameaçassem irromper a cada instante, ao escrevê-lo. É bonito o poema, este poema de amor que escreveste para denunciar o nosso amor de sempre, porque existiu mesmo antes de nos encontrarmos, como bem se percebe quando os nossos olhos se cruzam ou quando dávamos as mãos.
Confrontado com as tuas palavras doridas, pergunto-me porque desembocámos neste lugar que não parece ligar com lugar algum e interrogo-me sobre a possibilidade de denunciar uma relação suportada num amor assim. Sobre as emoções não me questiono, porque tenho por seguro que este carinho que nos liga só se esgotará quando a vida se esgotar em nós. Falo por mim, mas pressinto que posso falar por ti.
Porquê meu amor? Porquê?
Disse-te múltiplas vezes que, se o custo de algum conforto de que possas beneficiar fosse perder-te, o aceitaria. De lágrimas nos olhos, reafirmo-to agora, se bem que, minha querida, não seja capaz de te garantir que o consigas, por mais que o mereças. De felicidade não te falo. Felizes foram os breves instantes em que pudemos sonhar juntos. Momentos como esses acontecem, pura e simplesmente.
Parecendo de despedida, esta carta é-o apenas no sentido que digo antes, isto é, de compromisso com a tua procura do sossego, do conforto físico e espiritual que não fui capaz de garantir-te, para minha infelicidade. Nesse sentido, é muito mais um até já, porque permanecerei como o refúgio em que sempre poderás recolher-te e porque conservo à vista aquele pequeno “ajulezo” que me ofereceste em data incerta, em que continua a poder ler-se: “Envelhece comigo, o melhor ainda está para vir”. Os pássaros que aí estão figurados, em que num deles te reconheço, assegura-me que assim será.
Perdoa-me por não ter sabido poupar-te a estes momentos de grande dor. Oxalá a dor da perda te possa soar pequena, na medida inversa da minha. Oxalá, meu amor, este passo que agora te propões dar não te conduza a um novo lugar que não leve a sítio algum.
Recebe um beijo e um grande xicoração deste infeliz que não foi capaz de levar-te a felicidade que não devia ser-te negada.

José Cadima

2 comentários:

Anónimo disse...

José
Li e reli este teu texto.
Tentei várias vezes comentá-lo, mas perdia sempre a coragem de o fazer.

Porque haveria de me chamar Helena?
Porque haveria de me rever nesse teu texto?

É ficção, decerto. Mas quantas vezes a ficção se aproxima da realidade?

Deixo-te um beijo

J. Cadima Ribeiro disse...

Cara Helena
(talvez devesse escrever "minha querida Helena", para preservar a intimidade da comunicação),
Helena, porque é nome de mulher. O reveres-te no meu texto é que me deixa preocupado, porque o escrevi com muita emoção e dor.
A ficção, pelo menos, devia ser menos penosa.

Um beijo,