sexta-feira, novembro 02, 2007

Ao Acordar

Acordei com uma dorzinha miúda. Quem ma trouxera tinha sido o frio da manhã, que me fazia cócegas nos pés. Acreditava que o dia me correria bem; acreditava que a ilusão me cobriria de flores luminescente, num dia nublado de Outono.

Vi-te ao longe, dos pés à cabeça. A utopia me dizia que a tua companhia me levaria a um lugar pelo qual doutra forma teria eu que lutar. Tua boca abriu-se. De lá saíram tantas palavras que… se desfez a utopia, se desfez a mais pequena ilusão deste dia ser diferente dos outros. Mais um dia em que teria que me controlar. Mais um dia em que teria de ser menos eu para ser mais forte. Talvez um dia pudesse sentir-me forte, mas, por agora, seria apenas mais um dia em que não seria eu.

Senti dor. Acordei com um picar na espinha. A dor era causada por um dos lados da cama onde me encostara incorrectamente. Olhei a janela e aceitei que o dia seria como o de ontem e não iria ser eu quem te amaria.

Vi-te; falaste-me; beijaste-me. Aos poucos, senti-me um pouco mais eu. Protegido pelo teu carinho, confortado pelas tuas palavras doces e serenas, fui-me encontrando. A utopia cresceu e do nada fez-se o momento mais perfeito que poderia acontecer. Fui feliz.

Acordei de barriga para o ar. Não havia dor. Não havia felicidade. Chovia.

Vi-te… Pensei que tudo isto seria antipatia. Pensei que seria um eu diferente, não forte por ter que ser forte. Não confortável, porque assim me sentia. O peito doeu-me. Sabia o que era: era tudo o que se tinha passado lá dentro, em revolta. Estava confuso.

Acordei na mais pura das dores, uma dor psicológica forte que se fazia sentir deste lado. Tive vómitos e, cá dentro, o corpo apertava-se para sobreviver. Estava assim fisicamente. Psicologicamente estava pior.

Imagina agulhas debaixo das unhas, vidros estilhaçados nas gengivas e olhos perfurados. Imagina só a dor de tudo isso. Entenderás a analogia se imaginares um corpo desencontrado da respectiva alma. Apenas, assim, fisicamente te posso transmitir a dor que sinto a cada palavra que ousas pronunciar sobre um passado teu tão recente que chega a parecer presente. Porque foi o que tu disseste que germinou cá dentro e agora cresce, agora ganha vida, alimentando-se da minha.

José Pedro Cadima

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