sexta-feira, janeiro 12, 2007

Minha Querida Helena

A agitação da última dezena de dias retirou-me o tempo, a concentração e a sensibilidade necessários para te escrever e para que o que te quisesse transmitir fizesse sentido. Estive nesse investimento de corpo inteiro e se, por um lado, me senti vivo, por outro lado, esgotei-me num projecto em que sempre achei deverem estar outros. A intriga, a cumplicidade de medíocres, a falta de coragem e a incompetência convergiram para me tirar de cena, o que, se me traz alívio, traz-me, no mesmo passo, uma raiva enorme. Sempre me custou ver triunfar os medíocres e os incompetentes!
Depois de, durante uns poucos dias, ter-me sentido vivo, receio agora retornar à minha agonia. Até porque viver custa e as energias que nesse esforço são gastas dificilmente são repostas. A ver vamos.
Ao jeito de compensação, tive a alegria de te ver jovem outra vez, nesse teu arranjo de cabelo que demorou tanto que me pareceu uma eternidade. Ainda bem que abandonaste a tua obsessão de te apresentar infeliz para fazer bem presente aos outros - especialmente a mim - a tua insatisfação. Minha querida: a infelicidade não precisa de ser cultivada; nasce espontaneamente de qualquer solo. O que necessita de ser cuidado é o gosto de viver. Jovem outra vez, minha querida!
Esse corpo e alma rejuvenescidos não são, entretanto, é bom que tenhas isso presente, fato que se use e se pendure no guarda-roupa a aguardar a estação homóloga seguinte. São fato de todo o ano. Só assim me reconheço na minha Helena. Só assim reconheço o meu amor.
Pese embora o episódico retorno à vida de que te falo a abrir esta mensagem. Não tenho a capacidade de me renovar que tu possuis. Gostava da ter, digo-te. Gostava da ter por quanto a mereces. Não sendo assim, fico a desejar colher de ti a força que sinto que me escapa.

Braga, 2 de Outubro de 2004


José Cadima

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