quarta-feira, dezembro 13, 2006

Minha Querida Helena

Já percebi a tua mensagem! Não precisas mais manter-te incomunicável com o mundo para não correres o risco de ouvir a minha voz do outro lado da linha. Não o queres, não o farei! Para mais, sei-te acompanhada por quem gostas muito, o qual, seguramente, te saberá dar o conforto que sei que te é necessário.
A esta distância, ganhou toda uma outra clareza a insistência que punhas na pergunta que me dirigiste na última ocasião em que estivemos juntos, em fim de jornada. O “agora, para onde é que me levas?”, que eu não percebi, não queria significar outra coisa senão a despedida que tinhas planeado e que imaginaste à medida da derradeira refeição de um condenado. Daí a tua recusa em acompanhar-me no jantar. Por isso, a tua tristeza, mesmo quando, acompanhando as pombas e as gaivotas, por alguns instantes, esvoaçaste ao longo da margem do rio.
Confesso-te que não sinto mágoa por não ter entendido o alcance do teu aceno de naufrago. Nunca gostei de despedidas. Evito-as sempre que posso. Se noutras ocasiões fui cúmplice de outros rituais de despedida, fui-o na ânsia de eternizar esses momentos de comunhão e porque, no fundo, sempre me recusei a creditar que fossem os últimos de uma entrega intima que, embora tu o recuses, foi muito profunda. Falo no passado, para invocar esses instantes, embora se apresente mais adequado usar o presente, querendo reportar-me ao amor que te tenho e que é agora alvo de expressão de recusa tão violenta da tua parte.
Com esse íntimo, questiono-me por quanto tempo mais aceitarás receber estas minhas cartas; quanto tempo passará até que, simplesmente, te recuses recebê-las ou lê-las. Aí, tens sempre a solução simples das rasgares antes de as abrires. Porventura, se isso te dá maior sossego exterior, toma as minhas cartas como correspondência de duas pessoas que cultivam o hábito e o gosto da escrita; dois velhos amigos de saudosas lides literárias.
Para mim, desde que as não tenha de volta, fica-me sempre a esperança que as tenhas lido e o conforto resultante de pensar que continuo a ter alguém com quem posso comunicar e a quem posso transmitir emoções e sensações provindas do fundo do coração.
De mim, meu amor não correspondido, terás todo o carinho e incentivo para que percorras um caminho mais feliz do que o que trilhaste comigo, e a certeza, que gostaria que désseis por certa, de um ombro onde sempre podes repousar.

Braga, 6 de Agosto de 2004


José Cadima

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