sábado, agosto 31, 2013

Alegra-me que sejam amarelos (2)

O comboio roda, balança, apita, corre,
e com ele corre, foge a paisagem que ladeia a linha.
A velocidade é irregular,
as paisagens sucedem-se,
umas acercando-se rapidamente,
outras tomando mais tempo.
Subitamente, pára.
Pára porquê? Pára para quê?
As imagens deixam de ser fugidias.
Fugidia permanece a minha atenção,
saltitando entre memórias do ponto de partida
e a realidade que se configura perante os meus olhos.
Formoselha?! Formosa?
Formosa mas não segura?
Mal-me-queres, pelo menos, não faltam,
embora eu prefira papoilas,
o vermelho rubro das papoilas, digo.
Permaneço alerta.
Perscruto o espaço que ladeia a linha
e ei-las que surgem,
combinadas com mal-me-queres amarelos.
Abre-se-me lugar para a esperança,
mesmo que o mais certo sejam os mal-me-queres.
Alegra-me que sejam amarelos.

K

quinta-feira, agosto 29, 2013

A alma é...

"A alma é a causa eficiente e o princípio organizador do corpo vivente". 

Aristóteles

[citação constante de mensagem recebida de Clara Costa Oliveira]

sábado, agosto 10, 2013

Desaparecer

Andar por aí?
Desaparecer a pouco e pouco?
Desaparecer, simplesmente?
A vida é feita de encruzilhadas, também,
aparte desafios,  
aparte encontros e desencontros.
Desalentado, injustiçado, descrente
sigo rumo que me leva a lugar incerto.
Desde esse lugar, em catadupa,
ocorrem-me questionamentos múltiplos,
vontade firme de não calcorrear caminhos trilhados.
Nesse ensejo, a dúvida mais presente é se é hora de desaparecer
ou basta-me andar por aí,
diluído em multidões que sempre me desconfortaram.
Desaparecer, sim!

José Cadima

domingo, agosto 04, 2013

Uma noite para esquecer

Uma casa magnífica, um quarto magnífico, um lugar de tranquilidade difícil de igualar, e nem por isso o sono me assiste, isto é, apesar de tudo ou por tudo isso, eis-me desperto, intranquilo, sem jeito, absolutamente perdido a meio da noite. Deitado porquê se nem por isso me sinto descansar mais? Presumo-te a dormir, a meu lado, mas nem por isso a tua quietude aparente me trás o sossego que me falta, nem por isso o teu sono me contagia. Desejava que sim, do mesmo modo que o teu sorriso me contagia, tantas vezes. Noutro dia consegui-lo-á(s). Noutro dia…
Resta-me voltar a mim, aos meios anseios, aos meus problemas não resolvidos, aos meus medos. O medo de não estar ao meu alcance ajudar alguém que me importa muito ajudar a sair do buraco no tempo em que se deixou cair, por razões que não sei descortinar. O temor de desacreditar que vale a pena resistir, ser quem sou. O receio que, nalgum momento, deixe de fazer sentido lutar contra os fantasmas que, tantas vezes, te levam para longe, mesmo caminhado a par comigo ou sabendo-te deitada a meu lado. Sinto a tua respiração mas não me sinto capaz de respirar contigo, embora desejando consegui-lo, embora ansiando fazê-lo, muito, muito…
Porque tem que ser assim? Porque tem que ser este, também, lugar de desencontro? Para já, desde logo, de desencontro de sonos. Pergunto-me sobre os sonhos e não tenho resposta certa, mais claramente dito, não encontro resposta.
De fonte segura, fica-me a vigília. Até quando? Quando soçobrará este corpo cansado perante o sono, esta intranquilidade perante a serenidade da envolvente tranquila desta casa imensa, cheia de memórias, alimentadora de sonhos?.
Não me ficando grande lugar para sonhos, à força de uma travessia longa de desapontamentos – cinquenta e muitos anos creio permitirem já o uso do qualificativo – queria nesta altura encontrar lugar para o sono, paragem no tempo, encontro possível com o vazio de inquietudes, se o pesadelo não se revelar mais forte. Nesse entretanto, poderia até voltar até ao teu abraço, mas o pesadelo é sempre realidade próxima.
Porquê? Porque me falha a resposta para tantas perguntas que me preenchem a mente e me enchem os dias? Porque me escapa o sono num momento em que precisava tanto reencontrá-lo? Porque me escapas tu quando precisava tanto que fosses o meu lugar de encontro?

José Cadima