sábado, novembro 29, 2008

Conversa do vazio

- Está tudo bem contigo?
- Nem por isso.
- Está tudo na mesma?
- Não…
- Então?
- Está simplesmente diferente.
- Diferente como?
- Vazio, mas diferente.

José Pedro Cadima

quarta-feira, novembro 26, 2008

As portas de um labirinto

Abro uma porta. Entro num compartimento. Sinto-me só. Tem quatro paredes e uma porta em cada uma. Abro a da frente e a de trás fecha-se. Dou um passo atrás, dou um passo para o lado, abro a porta do lado esquerdo e a da frente fecha-se. Dou dois passos para o lado direito e abro essa porta, a do lado esquerdo fecha-se. Dou um passo para a esquerda e um para trás, viro-me para a porta de onde vim e abro-a, fecha-se de novo a porta que tinha aberto e eu vou em frente, no caminho para o passado.
Vejo portas a abrir-se e a fechar-se, sempre um ciclo que pareceu ocorrer na minha vida. Encontro compartimentos hexagonais ou até circulos com uma única porta, um único caminho a tomar, que quando se entra nesse compartimento nem para trás dá para voltar. Há salas estranhas, em que abrir uma porta faz abrir três ou quatro. Encontro salas com portas trancadas, que é preciso forçar para entrar. Encontro compartimentos que a única porta que têm é aquela pela qual viemos. Encontro salas que, para além das portas laterais, têm no meio um poço; pior, encontro salas que só têm o poço.
Paro. Tenho a memória desta sala, tenho a memória da minha escolha, da escolha da porta que segui. Lembro-me que foi difícil: seis portas e um poço, as saídas desta sala; dei duas voltas ao poço; tinha já atravessado mais de mil salas, aberto mais de mil portas e parecia tudo igual, parecia estar sempre no mesmo sítio, e o poço, era a única entrada que não tinha experimentado. Mas passou a correr por mim alguém, abrindo uma porta e escolhendo rapidamente outra. Era um conselho…
Certas pessoas atravessam umas portas para encontrar riqueza. Outros atravessam outras portas para achar amor. Uns espreitam as fechaduras à procura de ver a felicidade. Uns quantos correm por todos os compartimentos. Esses querem tudo. Eu já não sei porque entrei aqui, não sei onde quero chegar. Atravesso as portas e os compartimentos como se tivesse a passear, a ver os outros viver. Não sei onde quero chegar.
Lembro-me de uma sala que baptizei “uma questão de tempo”, porque ela era mesmo isso: uma questão de tempo. Devia ser uma penalização por ter escolhido a porta errada. Era uma sala que, quando nela se entrava, não se encontrava nada, nem mesmo a porta por onde viéramos. E porque pensava eu estar tudo acabado, deitei-me e adormeci à espera que a morte me levasse. No momento mais profundo do meu sono, algo me acordou. Havia uma porta à minha espera, no tecto da sala, um alçapão para um nível acima daquele em que me encontrava.
Nesta volta ao passado, vejo mais pessoas atravessar outras portas, rapidamente, quase sem pensar, deixar o instinto escolher por elas, viver rapidamente, passar tudo aquilo. Chegarão elas ao fim mais rapidamente que eu? Eu espero, penso, toco a cada porta; espreito se na outra está aquilo que eu não sei se procuro. Sinto a porta. Tento sentir o que está do lado de lá. Desenho caminhos, escolho previamente portas antes de saber como me vou deslocar até elas.
Tantas portas que odiei escolher. Agora, arrependo-me de cada uma das que abri com as minhas próprias mãos. A caixa de Pandora trouxe-me, de facto, algo. Errado! Eu é que entrei pela caixa a dentro. Eu é que enfrentei todas aquelas coisas e, no fim da caixa, no fim do labirinto, alimentei a esperança de achar aquilo que não sabia se queria; melhor: aquilo que ainda não sei se quero.

José Pedro Cadima

segunda-feira, novembro 24, 2008

“A política à moda de Braga”

“Quando encarava já seriamente a eventualidade de arrumar as botas ou, melhor dizendo, a esferográfica, tive a grata notícia de que tinha um leitor. E, mais: um leitor atento que podia identificar pelo nome.
No meu modo de ver, são estas pequenas coisas que dão sentido à nossa vida, e daí que não tenha hesitado nem um momento relativamente à necessidade de fazer público o meu júbilo e, sobretudo, a minha gratidão.
É certo que o meu caro leitor insinua discordância face a opiniões que exprimi em crónica dedicada ao urbanismo, trânsito e ambiente em Braga. Mas isso são coisas pequenas comparadas com a grandeza da cidade e, especialmente, com a simpatia que me inspira o meu caro leitor.
Fico, é verdade, intrigado com a interpretação que fez da minha afirmação da identificação inata do eleitor e do eleito: quererá o meu leitor afirmar a tese que se trata de gente distinta? Assim uma espécie de classe operária, por um lado, e exploradores capitalistas, por outro, ou o problema radica mais fundo e o meu amigo terá mesmo sido ludibriado pela alternativa ilusória adiantada pelo PSD local?
Se é este último o caso, não me resta senão solidarizar-me com a vítima. Mas, deixe lá, outros mais conhecedores dos bastidores políticos bracarenses também não perceberam que o PSD não mantinha real interesse na disputa. Era apenas uma questão de cumprir a obrigação. Alguns amigos meus, menos piedosos, diriam, a propósito, que o partido governamental se havia disposto a mais um ritual de sacrifício de um cordeiro.
Talvez diferentemente da opinião do caro leitor, é realmente isso que me indigna e me perturba: essa declarada abstenção de apresentar alternativas, de ver mais longe, de ultrapassar a discussão mesquinha e discutir a cidade nas suas diversas facetas, urbanismo, ordenamento do tráfego, ambiente, equipamentos urbanos. É que eu acredito que há gente capaz em Braga, mesmo quando PS, PSD, PP e Arco-íris nos querem provar o contrário. É que eu acredito, caro concidadão, que não estamos condenados a tomar posição entre o Mesquita e o Macedo ou entre o Fernando Alberto e o António Braga.
Claramente, entendo eu, é preciso ousar! Urge que ousemos ir além da mediocridade instalada. Temos homem (homens) para isso? Gostaria de acreditar que sim.”

J.C.
(reprodução integral de crónica do autor identificado publicada no jornal Notícias do Minho de 95/06/03, em coluna regular genericamente intitulada “Crónicas de Maldizer”)

sexta-feira, novembro 21, 2008

Fortalecer-me

Ainda há pouco uma tormenta
Daquelas que nos fazem estremecer
Me surpreendeu no horizonte
Tentaste, para minha surpresa,
De várias formas suavizá-la…
E até conseguiste dominá-la
Dizem que o amor se fortalece
Nos momentos difíceis
Dizem que o amor aguenta
As tormentas mais difíceis
Que fundo terá de verdade?
Quando estou contigo
A tormenta não chega cá
Fica perdida no horizonte
Ou passa bem ao lado rapidinha
Obrigada, meu amor, por me fortaleceres
Obrigada, meu amor, por me defenderes

C.P.

quarta-feira, novembro 19, 2008

Querido Pai Natal (2)

Queria pedir-te alguma sanidade, pois é isso que mais me falta. A paz no mundo não me aquece nem me arrefece. É apenas uma utopia que muitos desejam sem sequer saber porquê. A guerra não é aqui; não vai cá chegar.
Quereria pedir-te alguma noção do que se passa. Sinto-me perdido; sinto-o de verdade. Não vejo dia em que não anoiteça, nem noite em que não veja o sol nascer. Todo o meu corpo suporta este cansaço, queixando-se apenas da saudade dos lençóis e não da cama.
Não te peço nada disso, por mais poder que tenhas. Não fui suficiente bom menino e castiguei o meu corpo com todas estas penosas preocupações. Em breve emergirá a verdade de tudo. Em breve perderei o resto da sanidade que me resta.
Não sei em que ano estamos. Talvez seja o ano dois mil ou o ano quatro mil. Pouco importa. A esperança média de vida não chega a um século e o ano faz apenas parte de uma data marcada para efeitos gerais. Também não me lembro do dia em que faço anos e já lá vão tantos que nem a minha idade sei. Pouco me importa se sou adolescente, adulto ou idoso. Continuo a ser eu. Pouco me importa se faço anos em Janeiro ou Agosto. Continuo a ter a mesma mãe.
Talvez o Pai Natal me pudesse dar a entender todas estas coisas e porque é que as marcamos. Talvez, nessas circunstâncias, também me possa nascer a vontade de saber as datas em nasci, em que ano estamos, entre outras.
Tamanho foi o meu desinteresse para com a vida que já não sei se isto é viver. Sei que se parece como tal: respiro, mexo-me, alimento-me, vejo, oiço e agora até escrevo à sua pessoa, que tão pouca gente sabe porque nos visita duas vezes por ano, uma vestido de velho de barbas longas outra de coelho.
Já lhe pedi tantas coisas. Sei que foram mais aquelas em que me deu algo. Ter tanto, fez-me mal. Talvez a culpa seja sua. Mas também outros têm tanto e ainda lhes dão mais e não perdem o interesse em receber. Talvez tudo isto seja apenas fraqueza minha.
O meu desinteresse arrasta-se à tanto tempo que além das datas do meu nascimento, o ano em que estamos, a idade do senhor que ninguém conhece, não sei também identificar muitos dos feriados patrióticos que se avizinham. Serei, por isso, um traidor da pátria? E se o for? Serei traidor de mim mesmo por não me lembrar do dia em que nasci? Que importa!? Talvez importe. Talvez não importe. Não tenho datas. Não sei o nome das pessoas que conheço, e escrevo uma carta à única pessoa que ainda me visita.
Não sei as datas, digo, e confesso-lhe que se não tivesse ouvido um passarinho cantar que amanhã era dia vinte cinco, e feriado, nunca lhe escreveria esta carta interesseira a pedir que neste Abril me traga um pouco de sanidade.


José Pedro Cadima

segunda-feira, novembro 17, 2008

“A propósito de projectos jornalísticos e de outras histórias”

“Num encontro ocasional, endereçou-me o director do «Notícias do Minho» convite para uma colaboração regular no seu jornal. Com a frontalidade que uso pôr nas posições que tomo, facilitada no caso em presença pela partilha de valores geracionais, retorqui-lhe na ocasião que não via reunidas condições para o meu envolvimento num «projecto jornalístico» que vagamente identificava. Para pôr mais claro – terá sido mesmo a expressão que usei – um projecto jornalístico que se definia por fundamentalmente pela negativa, isto é, cujo elo de união entre os seus promotores residia em estarem contra alguma coisa ou alguém.
Tudo terminaria aí não fora o jornalista em referência, já quando virava as costas para se afastar, me ter respondido que o seu projecto não era mudar o mundo. Receio bem que não tenham sido essas as palavras que usou, mas também isso não é o essencial. O essencial seria, na leitura que faz, cultivar um projecto de liberdade informativa, de abertura à sociedade na sua pluralidade, grandezas e misérias.
Cultor da liberdade que sou, a ponto de ser incapaz de aceitar amarras clubísticas por mais ténues que sejam, esta resposta desestabilizou-me. Provocador sim, mas não tanto!
Ora, eu que me mobilizo especialmente pelo que me desafia, pelo que é novo, não vi forma de aplacar a minha consciência que não fosses desestabilizar o provocador (pelo menos, tentar; haverá mérito naquele se souber acomodar a provocação). E é assim que, quinze dias depois, aqui estou, perante o director do jornal e perante os seus leitores (se o director em questão deixar passar), com esta minha primeira «crónica de maldizer».
Cuidem-se os cultores da desgraça, cuidem-se os acomodados, tomem cuidado os adeptos de normalidades institucionalizadas, políticas e culturais, pois o meu projecto é desetabilizar, quer dizer, reafirmar que a «utopia» está viva. Mortos seremos nós quando desistirmos de construir alguma coisa, lutar por algo.
«Make love, not war»!
Abaixo os descobridores do «fim da história»!”

J. C.
(reprodução integral de crónica do autor identificado publicada no jornal Notícias do Minho de 94/10/15, em coluna regular genericamente intitulada “Crónicas de Maldizer”)

sábado, novembro 15, 2008

Gostar de ti

Se gosto de ti?
Ainda te sobra dúvida sobre isso?
Gosto! Claro,
embora talvez preferisse que fosse doutro modo.
Teria menos inquietude.
Viveria menos angustiado
com o receio de te ver partir, um dia,
amanhã, talvez.
Tentei-o; tentei-o, convictamente,
mas perdi.

Agora, que sou eu sem ti?
Falhado que foi o empreeendimento
de não ser, para ti,
mais que um desconhecido,
restar-me-á, porventura, o destino de te amar
mesmo quando eu não seja já para ti
mais que uma memória,
amarga ou de travo doce, suave.

José Cadima


[texto inspirado em "O teu amigo desconhecido", de José Pedro Cadima (2004)]

quarta-feira, novembro 12, 2008

Minha querida

Nunca pensei ser tão confortável estar contigo. Nunca pensei ser tão bom sentir-te encostada a mim. Nunca pensei que tudo voltaria a acontecer assim, desta forma.
Sei que tudo isto só pode ter um nome, mas não o ouso prenunciar. Talvez dê azar. O teu toque é, apesar de tudo, algo receoso. Talvez tenhas medo de me tocar. Talvez, penses estar a fazer algo errado. Quando te toco, não vejo nada de errado. Só vejo algo que queria muito fazer: tocar-te; sentir a suavidade da tua pele.
Quando da tua boca saíram palavras que eu em parte esperava, isso fez-me apenas pensar que já não era preciso eu chatear-me com uma pergunta que há muito tinha pensada. Pensei depois em dizer-te o quanto te queria, mas não valia apenas pois não? Tu já o sabias, tu já o sabes.
Disse-to na mesma. Disse-te que te queria. Disse-te que não te percebia. Também disse ou pensei dizer-te que vou odiar se quiseres alguém que não eu. Principalmente, se realmente eu for tão importante para ti quanto tu o sugeres. Não, direi antes: principalmente, em razão de quanto és importante para mim, porque ninguém realmente se importa com o que o outro sente. Apenas com o que ele(a) próprio(a) sente. Eu sinto que te quero, e sinto que quero que me queiras.
Dormi. Acordei apenas para perceber que não devia fazer isto. Não te devia dizer coisas que já sabes. Não devia ir contra o que aprendi a fazer nestes últimos meses. Aprendi a controlar-me. Sabes? Continuo a ser o que sou. Continuo a agir como sempre. Continuo a receber palmas do público. Eu sou o espectáculo, o algo diferente que ninguém está à espera, e vou amontoando pontos, vou ficando um espectáculo maior, com mais gente a querer assistir, mas faço as mesmas coisas, sou a mesma pessoa. O público é que é fraco, desconhecedor. Sofre a repetição sem que me culpe. Mas quando os assuntos são meus e não do público, eu aprendi a ser diferente, a controlar tudo aquilo que dantes me fazia perder o controlo e a auto-destruir-me.
Eu amo-te. Essa é a verdade. Por mais diferente que esteja, a verdade é que te amo. Não to vou dizer mais vezes. Não te vou impor essa verdade. Vou apenas deslocar-me de ti para mim, tentando manter o equilíbrio, tentando não magoar ninguém, nem a mim, nem a ti.
De agora em diante, vou ver o tempo passar. Vou aproveitar cada momento contigo. Vou ansiá-lo tal como te anseio a ti. Vou tentar apreciar cada momento que possa estar contigo. Com as minhas carícias, vou-te demonstrar quanto te amo, e ansiar as tuas, mesmo sem sexo, porque muitas vezes isso não é o que realmente importa.

18 de Setembro de 2006

José Pedro Cadima

segunda-feira, novembro 10, 2008

Sentir-te a meu lado

“Deito-me e sinto-te a meu lado”,
dizias-me tu há algum tempo,
não muito porque curto
é ainda o horizonte do nosso encontro.
Também eu te imagino a meu lado,
mas vezes há em que a magia
de que me sinto possuído não tem força bastante
para tornar real o desejo sonhado.
Que será que te leva para longe?
O vento que pressinto lá fora
ou os fantasmas que habitam a tua e a minha cabeças?
Concentrando-me muito,
chego, por vezes, a ouvir o sussurrar das tuas palavras,
mas mais não consigo.
Sobretudo, o sonho de aconchegar-te no meu leito,
de abraçar-te demoradamente
soa-me a quimera.
Em sonhos, envolvo-te nos lençóis,
deito-te a meu lado.
Pena é que seja só em sonhos!
Valem-me os sonhos, apesar de tudo.

José Cadima

domingo, novembro 09, 2008

Quando vejo a chuva cair

Vejo a chuva cair
e interrogo-me se, com ela,
não vão as minhas próprias lágrimas,
lágrimas de desconsolo e de desencanto.
Olho a chuva, lá fora,
e vejo as minhas próprias lágrimas,
que já foram de amor e, agora, são só de dor.
Olho a chuva lá fora, que cai grossa,
e vejo o meu mundo desfazer-se,
agora que sinto que o amor não alcanço.

José Pedro Cadima

(poema extraído de Sonhos a um Espelho, Papiro Editora, Porto - no prelo)

quinta-feira, novembro 06, 2008

O amanhã de amanhã (2)

Deito-me em lágrimas.
Tento esquecer o meu dia
e sonho que amanhã seja diferente,
seja melhor.
Quase nunca o é!
Ao deitar, amanhã,
é quase certo que irei, de lágrimas nos olhos,
pedir que o amanhã de amanhã
seja melhor do que o de hoje.

José Pedro Cadima

terça-feira, novembro 04, 2008

“Tudo pelas leitoras”

“Um grupo de leitoras fez-me chegar uma missiva em que exprimiam, em termos enérgicos, o seu protesto pelo que afirmavam ser a minha menor consideração pelo sexo feminino, melhor dizendo, pelas leitoras. Isto tudo porque, conforme anotavam, em diferentes crónicas eu me dirigi expressamente aos leitores e nem uma só vez às leitoras.
Admito já que errei. Não no sentido que as minhas caras leitoras me acusam mas pela omissão óbvia do artigo definido adequado. Quero, no entanto, desde logo também fazer explícito que, mesmo quando fiz uso do termo leitor, a maioria das vezes era nas leitoras que estava a pensar. Confesso, aliás, que são as minhas caras leitoras que me ocupam o pensamento a maior parte do tempo. Considero mesmo a insinuação do contrário de muito mau gosto.
Não há que confundir, entretanto: ter em especial apreço as mulheres não significa que tenha de fazer de conta que considero melodiosa a voz ministra da educação ou que o seu discurso sobre a educação me soa a canto de sereia. Sinceramente, pelo contrário, espantava-me que me dissessem que a senhora alguma vez foi capaz de levar na cantiga alguém do sexo oposto. Para mim, a senhora soa-me mais a situação análoga à daquelas atletas que se descobre depois que são homens. Quer dizer, contrariando a voz corrente, nem tudo é uma questão de bugalhos e melancias.
Membro do governo por membro do governo, admito que prefiro a Isabel Mota: tem uns olhos muito mais bonitos, uma voz quente, para além de outros atributos que me escuso agora de referir. Pode não ser grande coisa como secretária de estado, o que é mais que certo, mas sempre é apresentável. E o jeitinho que tem para se referir aos milhões de Bruxelas?! Não admira que o Parcídio se tenha mostrado grato pela visita recente da secretária de estado ao Vale do Ave. Daí podem imaginar a atenção e o agrado com que seriam recebidas a Claudinha e a Naomi. Têm bom gosto os autarcas do Vale do Ave; há que reconhecê-lo.
Com isto, caras leitoras, creio ter deixado bem a nu a falta de substância do protesto lavrado que me endereçaram. Aliás, se a expressão não fosse excessiva, eu terminaria sublinhando que há mesmo leitoras pelas quais estaria disposto a fazer algumas loucuras.”

J. C.
(reprodução integral de crónica do autor identificado publicada no jornal Notícias do Minho de 95/09/02, em coluna regular genericamente intitulada “Crónicas de Maldizer”)

domingo, novembro 02, 2008

Minha Querida Helena

Não esperava ter uma mensagem tua tão longa e circunstanciada nesta ocasião. Do que me dizes, fico com o sentimento que a última tarde que passámos juntos foi uma desgraça. Lamento, embora eu já te tivesse prevenido da desgraça que sou em muitas ocasiões.
Afinal tens cinco defeitos. Assim sendo, já não me vou sentir tão desconfortável por ter tantos defeitos, embora os meus sejam um bocadinho mais graves que os teus. De alguns que tenho nem me quero lembrar.
As considerações que fazes a respeito da nossa relação afectiva e o empenho que pões nela deixam-me muito desconfortável. Com os defeitos que tenho, não o mereço, de modo algum. Vê lá tu que ainda ontem te fiz chorar, o que nunca deveria acontecer.
Aproveito para te agradecer o tom apaziguador que usas na tua mensagem. Por uma razão ou por outra, não tenho estado muito bem nestes últimos dias, o que também não é novidade nenhuma.
Estou numa fase da minha vida que necessito permanentemente de refúgio. Não deveria ser assim mas é verdade. Não queria, no entanto, penalizar-te com isso. É em razão dessa circunstância e da forma como tu reages a algumas coisas que te digo, mesmo quando são brincadeiras, que sei que, algumas vezes, não sou a companhia certa para ti.
Repara: como te tenho dito amiúde, há ocasiões em que necessito de me exprimir de forma completamente aberta, sem gestão das palavras. Se com isso gero desconforto em quem me houve, porque é eu a devo penalizar? Para mais, se se trata de alguém de quem gosto um bocadinho.
Por favor, não te martirizes. Se souber que tu estás bem, fico satisfeito. Evita referir-te às tuas vivências passadas. Lido mal com isso. Quando faço alusão a essas matérias é sempre de forma provocatória (e algumas vezes involuntária). Limita-te a evitar responder às questões que te faço em relação a essas temáticas.
Fico contente por saber que o fim-de-semana te correu bem, apesar das dores de cabeça que te provoco.
Um beijo muito grande,

José Cadima

Ps: estive a fazer os trabalhos de casa que trouxe para o fim-de-semana; felizmente, já me desembaracei deles.