quinta-feira, novembro 29, 2007

Meu peixe…

As aventuras são um mal.
Só as tem quem não as quer!
As imagens do meu último momento heróico
estão já estilhaçadas:
subi montanhas, saltei vales,
nadei com piranhas e outros males.
Um peixe quase me comeu!
Era grande, era forte
a minha vontade de te amar;
até os ossos me roeu.

José Pedro Cadima

terça-feira, novembro 27, 2007

O meu coração está na tua mão

O meu coração está na tua mão.
Da esquerda para a direita,
da direita para esquerda,
olha como ele balança.
Não o deixes cair,
senão esgotar-se-á o meu sorriso.

José Pedro Cadima

sábado, novembro 24, 2007

Sinto-me assim

Só.
Triste.
Descrente
de ser amado.
Sinto-me assim.

Onde estão os braços
em que disseste que me poderia sempre recolher?
Onde está o peito
em que posso repousar minha cabeça
e sonhar que o mundo é só o aconchego que daí me vem?

José Pedro Cadima
e
José Cadima

quinta-feira, novembro 22, 2007

Minha Querida Helena

Ter-te-ás dado conta que as duas mais recentes cartas que te dirigi iam com as datas gralhadas: em vez do que aparece, deveria estar 17 e 18 de Agosto, respectivamente. Vais ter que me perdoar isso, que outra coisa não é que a expressão de uma mente cansada e baralhada. A gravidade da falta deverá ser compatível com o nível de tolerância que tu manténs em relação aos meus erros – assim o creio.
Na verdade, escrevi-te quase só para te transmitir isso e deixar este apelo. Não fora este pretexto, não querendo, por outro lado, repetir-me nos meus lamentos, não teria assunto para esta mensagem. Como bem sabes, não é assunto com que se mace quem quer que seja, muito menos alguém de que muito se gosta, dar notícia de um dia de trabalho cinzento após outro de idêntico tom, de um arrastar de pés dia após dia sem alegria nem esperança.
Assim sucedendo, dando corpo ao pensamento que me assiste, e também como forma de preencher esta página, ouso citar o meu filho num dos seus versos tão forte nos sentimentos que transmite quanto impressionante nos termos de que se socorre; a saber:

Demónio da minha paixão

Rio de sangue,
que transportas o meu demónio,

permite que eu aceda
ao favor de um beijo
que me faça sorrir.


Demónio de sangue,
demónio esbanjador,
faz-me um favor:
espeta-me um beijo e sorri.

Demónio de escolta,

meu segurança
dos demónios à solta,
espeta-me um beijo e sorri.

Demónio da sorte,

transportador da minha felicidade
ou morte,
espeta-me um beijo e sorri.

Demónio alimentador

da minha paixão grande e assombrosa,
espeta-me um beijo e sorri.

Demónio sugador

de toda a minha atenção;
demónio que me arrebata o coração;
espeta-me um beijo e sorri.

Demónio do amor,
rainha da beleza,
só tu fazes a minha dor.
Por assim ser,
espeta-me um beijo e sorri.

Demónio da minha vida

e da minha glória,
nem tu sabes o quanto
te quero arrancar um sorriso;
pois, meu amor,

tu és o meu demónio
e eu não sei viver sem ti.
(Cadima, José Pedro; 2004)

Sem mais palavras, quase sem palavras, despeço-me de ti, “demónio da minha vida”.

Braga, 19 de Agosto de 2004


José Cadima

terça-feira, novembro 20, 2007

Afogo-me em pensamentos

Afogo-me em pensamentos
sobre o que é e o que não é,
e não encontro a resposta.

Há tanto tempo que me interrogo
que perdi a pergunta
num monte de respostas falhadas.

José Pedro Cadima

sábado, novembro 17, 2007

A ironia

Odeio a ironia,
apesar da usar.
Odeio-a tanto, talvez, por ser das poucas armas
de que sou capaz de valer-me.
Odeio a ironia
e, em razão disso, odeio aqueles que dela se valem
para me atormentar.
Odeio a ironia tanto quanto aprecio um sorriso aberto
e a transparência que, de quando em quando,
reconheço no teu olhar.

José Pedro Cadima

quarta-feira, novembro 14, 2007

Sonho contigo

Olho-te
e, enquanto repouso meus olhos em ti,
a minha mente vagueia
pelo terreno do sonho
que seria saber seguro o teu amor.
Depois, à noite, a memória desses pensamentos
perturba-me o sono.

Toco-te
e, ao tocar-te, mais me cresce o desejo de abraçar-te
e a vontade de apertar-te contra mim
a ponto de parecermos um só.
Depois, à noite, falta-me a suavidade da tua pele
e, por isso, não durmo.

Beijo-te,
esparsamente, mas beijo-te.
Por serem tão esparsos os beijos que trocamos,
passo o tempo todo à procura de mais um beijo
e a ansiedade que daí me vem
faz-me permanecer acordado, à noite.

Sonho contigo,
e esse sonho de conquistar o teu amor
impede-me de dormir
e sonhar contigo.

José Cadima
(adptado de Cadima, José Pedro , Poesia 2005)

segunda-feira, novembro 12, 2007

Minha Querida Helena

As horas passam,
o tempo voa,
e eu continuo aqui
sem amor,
sem ti.

Só no meu coração
te vejo,
te beijo
e te abraço.”
(Cadima, José Pedro; 2004).

Leio este versos, releio-os e pergunto-me: do que dizem, referido a um tempo que é passado mas ainda presente, o que sobrou para o dia de hoje? Transfigurando-me na pessoa do autor – e tal não se me afigura nada complicado - quero eu dizer:

As horas passam,
nalgumas ocasiões mais céleres que noutras,
e eu continuo aqui
sem amor,
e sem ti.

O meu coração
ainda te pressente,
os teus beijos são doces recordações
e a lembrança do teu xicoração sugere-se-me uma expressão de afecto
que resistirá a todas as desventuras deste romance.

Entretanto, começo a descrer
da força que parecia alimentar esse amor.
E descreio mais ainda
que os beijos que me davas
tivessem génese inteira no teu coração
porque, se assim fora, não te teria sido possível ignorar
durante todas estas semanas o meu lancinante grito de dor.

Duvido, bem assim, que o nosso xicoração tivesse o mesmo significado de entrega para ti que para mim porque, se assim fosse, ter-me-ias estendido o braço quando pressentiste que começava a afogar-me em desespero e em solidão. Não o fizeste e nada disso pode ser lido como expressão de acaso. Não o quiseste fazer. É tudo!
Repara: poderia ter-me afogado do mesmo modo. Mas terias tentado; terias dado sinal de humanidade e terias afirmado uma memória de afectividade, de entrega que estaria para além dos desencontros de percursos cruzados que não foram capazes de fazer do lugar do encontro o lugar de uma vida plenamente preenchida.
Posso estar a ser injusto contigo como, noutras alturas, tu terás sido injusta comigo. A verdade, porém, é que, nesta altura, descreio que tudo não tivesse passado de uma desatenção ou deficiência de percepção da tua parte do apelo de socorro que te dirigi repetidamente. Face à gritante evidência dos dados que estão à vista, manda a razoabilidade que conclua que, simplesmente, me ignoraste.
Minha querida Helena: a minha ferida é profunda; talvez não tão profunda, todavia, quanto o meu desapontamento.
Um beijo para ti ou, talvez, um até sempre.

Braga, 1 de Setembro de 2004

José Cadima

sábado, novembro 10, 2007

A solidão como meio de encontro

A solidão também pode ser um estado de alma.
A solidão também pode ser boa,
uma oportunidade de reencontro,
um momento de purificação da alma.

Momentos há em que essa é solução única
para sossegar o espírito, apaziguar fantasmas,
recuperar a energia de que necessito para o dia seguinte.
Nessas alturas, a solidão é uma benesse.

A solidão também pode ser uma viagem solitária de automóvel,
percorrendo uma estrada que não me leva a outro qualquer lugar
que não seja ao retorno a mim mesmo.

A solidão também pode ser um desfilar apressado de imagens
que são, simplesmente, cenários do percurso
que me deve reconduzir à minha essência profunda.

Só, penso em ti
e nos momentos felizes que passámos,
de que tenho saudade tão intensa que só resisto a ela
retomando um estado de solidão tão sereno
que nada mais conta senão tu e eu.

José Cadima

quarta-feira, novembro 07, 2007

Duvidar

Quando duvido não é por ter falta de evidências,
mas sim por elas estarem ali tão obviamente à minha frente.
É que, quando tudo me sorri,
não sou capaz de deixar de me questionar
sobre quanto tempo vai levar
até que me venha, de novo, a vontade de chorar.
Quando duvido …

José Pedro Cadima

domingo, novembro 04, 2007

“Vão passar anos até que eu me perdoe”

“Pois é verdade: há dias levantei-me às quatro e meia da noite! Vá lá, censurem-me o mau gosto, que bem mereço.
Seria bastante mais razoável que me tivesse deitado a essa hora, salvaguardado que isso se ficasse a dever a uma noite bem passada. A vida, todavia, tem destas coisas, e não é por acaso que o prémio Nobel da Economia foi atribuído a autores de contribuições teóricas que enfatizam a racionalidade limitada dos agentes económicos; o que é paradoxal, por seu turno. Consistente seria mesmo que o ponto de partida fosse a irracionalidade com que os homens conduzem as suas vidas, incluindo a vertente económica destas. Mas não; entendeu-se partir do princípio oposto e foram precisos cerca de dois séculos desde que a Economia adquiriu estatuto científico para ver o óbvio.
É bem apropriado neste caso o dito que afirma que «o que está à vista é o mais difícil de ver». Nesta situação, nem a circunstância do gato ter o rabo de fora ajudou. Não nos desviemos entretanto do que importa.
Na ocasião, o que verdadeiramente é relevante é que me levantei a meio da noite, isto é, a horas que só deveriam ser usadas para o sono ou para outros prazeres da vida. Daí que seja bem feito que me censurem, como eu me censuro. Pensando bem no assunto, julgo que vão passar alguns anos até que eu me perdoe”

J.C.

(reprodução parcial de crónica do autor identificado publicada no jornal Notícias do Minho de 96/11/01, em coluna regular genericamente intitulada “Crónicas de Maldizer”)

sábado, novembro 03, 2007

Por querer-te tanto

Por querer-te tanto
É que não te quero!
E sobre as folhas de Nenúfar
Silencio o coaxar
Que chama
O teu corpo,
O teu cheiro,
As tuas mãos,
O teu olhar.
E vagueando no meu grito,
Sinto a raiva de já não te poder
Oferecer-me por inteira.

Helena, MC

sexta-feira, novembro 02, 2007

Ao Acordar

Acordei com uma dorzinha miúda. Quem ma trouxera tinha sido o frio da manhã, que me fazia cócegas nos pés. Acreditava que o dia me correria bem; acreditava que a ilusão me cobriria de flores luminescente, num dia nublado de Outono.

Vi-te ao longe, dos pés à cabeça. A utopia me dizia que a tua companhia me levaria a um lugar pelo qual doutra forma teria eu que lutar. Tua boca abriu-se. De lá saíram tantas palavras que… se desfez a utopia, se desfez a mais pequena ilusão deste dia ser diferente dos outros. Mais um dia em que teria que me controlar. Mais um dia em que teria de ser menos eu para ser mais forte. Talvez um dia pudesse sentir-me forte, mas, por agora, seria apenas mais um dia em que não seria eu.

Senti dor. Acordei com um picar na espinha. A dor era causada por um dos lados da cama onde me encostara incorrectamente. Olhei a janela e aceitei que o dia seria como o de ontem e não iria ser eu quem te amaria.

Vi-te; falaste-me; beijaste-me. Aos poucos, senti-me um pouco mais eu. Protegido pelo teu carinho, confortado pelas tuas palavras doces e serenas, fui-me encontrando. A utopia cresceu e do nada fez-se o momento mais perfeito que poderia acontecer. Fui feliz.

Acordei de barriga para o ar. Não havia dor. Não havia felicidade. Chovia.

Vi-te… Pensei que tudo isto seria antipatia. Pensei que seria um eu diferente, não forte por ter que ser forte. Não confortável, porque assim me sentia. O peito doeu-me. Sabia o que era: era tudo o que se tinha passado lá dentro, em revolta. Estava confuso.

Acordei na mais pura das dores, uma dor psicológica forte que se fazia sentir deste lado. Tive vómitos e, cá dentro, o corpo apertava-se para sobreviver. Estava assim fisicamente. Psicologicamente estava pior.

Imagina agulhas debaixo das unhas, vidros estilhaçados nas gengivas e olhos perfurados. Imagina só a dor de tudo isso. Entenderás a analogia se imaginares um corpo desencontrado da respectiva alma. Apenas, assim, fisicamente te posso transmitir a dor que sinto a cada palavra que ousas pronunciar sobre um passado teu tão recente que chega a parecer presente. Porque foi o que tu disseste que germinou cá dentro e agora cresce, agora ganha vida, alimentando-se da minha.

José Pedro Cadima